Eu queria ser diferente
Quando te vejo
O meu desejo
Era olhar-te sem ver
Simples lampejo
Do teu corpo ondulante.
Queria passar por ti
Tranquilo, calmamente
Mesmo distante
Como de tanta gente
Por quem passo;
E Intuir-te a graça
Mas sem olhar p’ra ti.
Queria apartar de mim
O pensamento
Qual tormento
Do teu falar cantado
O doce acento
E a tua boca
Onde o sorriso brinca
E resplandece;
Como posso esquecer
O que não esquece?
Quem dera não parecer
que vou enlouquecer
por querer sentir-me imune
ao teu encanto;
Prouvera eu te ligasse tanto
Como me importa
O odor perfumado
Deste cigarro
Que fumo e logo esqueço
Quando se apaga o lume.
Mas só ando a fingir
Que não me iludo
Ganhei cisma em não querer
E queria tudo
Só que não sei mentir-me
Sou sincero,
E não posso fingir
o que não sou.
Sei que é estranha em mim
Esta dúbia atitude
De querer afastar
a quem venero
por não poder esquecer
o que não sei se quero:
- quem nunca, de si,
um pouco me quis dar.
Eugénio de Sá
(Poema inspirado num texto
de Adhémaro Gomes de Azevedo)