Vá!
Procure de uma vez o seu destino,
Acabe de uma vez com o desatino,
Acabe de uma vez com meu tormento
Liberta-me de tanto sofrimento,
Liberta-me de uma vez desta ilusão...
Vá!
E deixe-me no abandono da saudade,
Vejamos de uma vez a realidade,
Que se tornou a nossa união...
Vá!
Prometo-lhe não vou seguir teus passos,
Nem vou lhe implorar um último abraço,
Vou recolher-me no descanso da solidão...
Vá!
Mas vá com a certeza de não ter arrependimento,
Procure não lembrar-me com lamentos,
Procure não pensar em ter perdão.
O amor é uma companhia.
Já não sei andar só pelos caminhos,
Porque já não posso andar só.
Um pensamento visível faz-me andar mais
depressa
E ver menos, e ao mesmo tempo gostar bem de ir
vendo tudo.
Mesmo a ausência dela é uma coisa que
está comigo.
E eu gosto tanto dela que não sei como a desejar.
Se a não vejo, imagino-a e sou forte como as
árvores altas.
Mas se a vejo tremo, não sei o que é feito do que
sinto na ausência dela.
Todo eu sou qualquer força que me abandona.
Toda a realidade olha para mim como um girassol
com a cara dela no meio.
Alberto Caeiro, heterónimo de Fernando Pessoa